Escada

     Em que pensamos quando descemos ou subimos uma escada? Que escada longa; Estou cansado; Minhas pernas doem; Essa pessoa lenta que não sai da frente; Estou atrasado; Vinte e quatro, vinte e cinco, vinte e seis, vinte e sete degraus; Que raiva quando o número de degraus não é exato; Ou não é par.

      Às vezes não pensamos em nada.

    Eu já pensei coisas estranhas enquanto, vez ou outra, atravessava uma escada. Quando subo, a escada desce. E quando desço, a escada sobe. Que idiotice. Nem tanto. Idiotice seria pensar que, quando subo, a escada sobe também. Neste caso acho que ninguém sairia do lugar ou chegaria a outro lugar.

     Também já pensei que, a cada degrau que subo, morre alguém e, a cada degrau que desço, nasce alguém. E como cansa menos descer degraus do que subi-los, nasce mais gente do que morre. Obviamente, não há relação de causa e efeito provada cientificamente. Entretanto, não haver estudo não é aceitar a inexistência do fenômeno. Nunca testaram se alguém nasceu justamente porque eu desci um degrau de escada. Quem sabe se o tipo ou o local da escada influenciam. Ou se as bolsas das gestantes ficam a espera de alguém descer um degrau para romperem. E se não for alguém genérico e sim uma pessoa específica? A bolsa só vai romper quando aquela pessoa descer um degrau. E quando a tal pessoa está no shopping, se aproxima da escada para descer e muda de ideia para a escada rolante, alarme falso na gestante. E se um grupo de pessoas juntas sobe de escadas? Chacina da Candelária.

     Os pensamentos em si não são o que me interessam primariamente. O que me intriga é pensar que pode existir um conjunto de pensamentos que tendem a ser pensados enquanto as pessoas atravessam uma escada. Não que sejamos obrigados ou estejamos confinados a pensar de acordo com este conjunto. Pode ser que o construamos e o modifiquemos com o evoluir social. Realmente não sei do que estou falando.